terça-feira, 28 de dezembro de 2010

IOMERÊ – Um povo bom, uma cidade linda. (publicado no Jornal "O Catarinense" em 2006).

Nos círculos de amizade de minha intimidade tenho sempre dito que, até aos meus quase 62 anos de idade, meu raio de existência não tem ultrapassado aos 50 quilômetros.   Assim o digo, porque nasci em Iomerê, vivi até os 12 anos em Arroio Trinta, lá permanecendo nos períodos de férias até os 17 anos, trabalhando em Videira até os 22 e, daí em diante, em Fraiburgo. Meu círculo de vida territorial restringiu-se a Iomerê – Arroio Trinta – Videira e Fraiburgo. Aliás, analisando bem, sou um homem privilegiado por Deus, pois todas essas cidades são lindas, onde todos nós podemos perambular pelas ruas, caminhando às soltas, tomando um café aqui, um chimarrão acolá. Passeamos a pé, pedindo como está a saúde do compadre. Bom dia Dona Maria como está a senhora? Você é filho do José? Não acredito! Como você está grande! Não é assim nossa vida aqui no interior? Pergunto: é possível tudo isso nas capitais? Não. Na maioria das vezes, não se conhecem nem entre visinhos. O stress do cotidiano é o eterno corre-corre na luta pelo ganhar sempre mais, porque as oportunidades do constante gastar é o grande desafio de todos.
Iomerê – que saudades da casa da minha nona, Maria Barbizan Pelle, mulher maravilhosa e linda, a melhor confeiteira de minha vida, onde o seu pão caseiro, imenso, macio como uma pluma, delicioso como o manjar dos anjos, assado naquele forno grande, a lenha, recoberto com gema batida de ovo. E aquele macarrão “furado”? (penne) E aquelas bolachas servidas em latas maravilhosamente fabricadas e com proteção interna de papel amanteigado? Nunca mais me esquecerei daquele parreiral repleto de uvas para serem degustadas, em pleno centro de Iomerê. Nunca mais esquecerei da maravilhosa Igreja, até hoje lá existente, sempre repleta aos domingos, quando todos, absolutamente todos lá se encontravam para muitas vezes rezar. Outras para lá desfilarem seus lindos vestidos rendados, outros mais para lá verem as lindas moças e, quiçá, serem agraciados com os olhares lânguidos das pequenas amadas, com um piscar furtivo e troféu máximo que o menino apaixonado poderia conquistar. Que saudades que eu tenho daqueles tempos em que as procissões de “Corpus Christi” eram um dos maiores eventos da então vila. Os senhores mais provectos e respeitáveis lá estavam comandando o cerimonial, as filhas de Maria e as senhoras do Apostolado da Oração, com muito orgulho ostentavam suas fitas e suas identidades de verdadeiras pregadoras de sua religião. E o senhor João Rech e sua esposa dona Rosina Rech? Quanta saudade desses meus padrinhos de batismo. Lembro-me perfeitamente da Cooperativa de Consignação e Consumo São Luiz, com sua sede grandiosa, naquele casarão de madeira com enorme porão onde eram fabricados os bons vinhos da época. João Rech a comandar o complexo que lá estava para abastecer a todos os seus associados. Um lojão, onde tudo podia ser encontrado. Como era bom ver o meu “nono” Aníbal Pelle fazer aqueles belos ternos e cortar o cabelo de todos os homens da vila. Como eu ficava triste com as intermináveis bebedeiras desse meu querido avô. Que saudade também do seu Edmundo Hentz outro alfaiate de fino trato de Iomerê, homem que sempre o vi como o mais sério dos trabalhadores. Esses dois eram responsáveis para deixar os senhores da cidade belos, aliás, às missas todos estavam sempre bem vestidos.
Iomerê, para mim, é um local sagrado porque lá estão as reminiscências de uma criança que sonhava com o Papai-Noel, que temia as bruxas, que muito chorou e muito foi feliz. Hoje Iomerê me deixa muito orgulhoso por ser uma cidade paradigma para todas as demais, por ter tido um exemplo de Administrador Público, pelas pavimentações impecáveis, pelos maravilhosos jardins públicos lá conservados, pela maior praça pública, pelas casas bem conservadas, pelo ar puro da cidade, pela ausência absoluta de ruídos.
Que saudades que eu tenho do médico Dr. Eder. E o Dr. Valdemar Mozzaquatro? Esse último um médico desbravador dos velhos tempos. Esses dois médicos exerceram esse sacerdócio em Iomerê e foram os precursores do exercício de uma das mais sagradas das profissões. Eles realmente foram aqueles que a pé, a cavalo, conduzidos ou conduzindo, levaram os lenitivos para seus pacientes, sanavam as dores com e exercício do conhecimento real do corpo humano. Esses deveriam ter suas estatuas na melhor praça da cidade e suas memórias cultuadas por todos os Iomereenses. E o povo de Iomerê? Esses são os verdadeiros heróis do cotidiano. Trazem o exemplo para todos os povos de como é possível construir uma comunidade solidária – segura – honesta e que sabem cultuar a religiosidade necessária para alimentar a alma e dar a real dimensão da seriedade e tornar agradável a vida de todos.

3 comentários:

Raquel disse...

Que lindo Dr. Flavio!
Fiquei maravilhada com sua cidade!
Confesso...querendo até conhecer Iomerê!
Suas lembranças engrandecem a cidade que te viu nascer!
Adorei,me vi andando nas ruas, e tive até vontade de provar aquele pão de forno e bolachas de sua avó! rsrsrssss

Paulo J. Piccoli disse...

O texto diz tudo com poucas palavras. Parabéns e obrigado por nos fazer lembrar também dessa forma de "como é linda, simples e única" nossa Iomerê. Moro na Bahia mas não consigo ficar muitos meses sem visitar minha familia e tudo o que o senhor descreveu em seu texto, como forma de "recarregar as baterias" que me movem e me permitem suportar as mazelas que vivemos fora dali.

Unknown disse...

Suas palavras me trouxeram lindas lembranças da infância. Iomerê é terra abençoada, digna de um texto tão bem elaborado e exposto para que , quem não a conhece, possa pelo menos imaginar quantas alegrias e amizades verdadeira fazem parte desse lugar!
Obrigado por nos presentear com tão verdadeiras palavras!! Jura Peretti Manfroi (filha de Iomerê)